sábado, 28 de fevereiro de 2009
Uma pausa inevitável
Embora envolvido numa tarefa tão divertida quanto extenuante (a conclusão de uma tese de Doutoramento), acreditei que podia conciliar esse estudo académico com uma actualização razoável de textos neste blogue. Infelizmente, não fui capaz. Com grande pena minha, o "Era uma vez na América" entra (oficialmente) em hibernação. Enquanto for possível, vou escrevendo no "Delito de Opinião", às vezes sobre os Estados Unidos, outras... sobre o que me parecer pertinente. Obrigado aos leitores, aos comentadores e aos que por aqui passaram. Até breve!
quarta-feira, 21 de janeiro de 2009
O discurso de Obama: duas notas
Num momento extraordinário da vida política americana, Obama começou por mostrar que é afinal tão humano quanto nós – tropeçando no juramento e mostrando grande inquietação e nervosismo. O Discurso Inaugural foi contudo apresentado sem falhas, em torno de duas ideias principais.
Por um lado, a inscrição do momento actual de crise numa história maior – a americana – repleta de desafios e dificuldades. Obama mencionou as dificuldades do exército americano na luta pela independência, dos pioneiros na grande aventura da exploração do Oeste, ou dos imigrantes na sua tentativa para singrarem na América. Todavia, o Presidente não deixou de sublinhar que os Estados Unidos foram sempre capazes de enfrentar esses desafios, demonstrando uma notável capacidade de superação. Há muita gente que ainda não percebeu o que quer dizer Obama com “esperança”. Não se trata de aguardar por soluções messiânicas, mas sim de apelar ao engenho e ao espírito de luta americanos – que nos momentos mais difíceis ergueram uma e outra vez os Estados Unidos.
Em segundo lugar, é notável a forma como Obama, partindo dessa referência a uma narrativa comum, apela ao esforço pessoal de cada indivíduo e à sua intervenção cívica – percebendo que o verdadeiro progresso de uma sociedade depende afinal do contributo de cada um dos seus membros. Estamos, pois, perante um verdadeiro elogio da cidadania – próprio aliás da tradição política americana – que destaca a singularidade de cada indivíduo, destacando simultaneamente o seu papel determinante num tecido social plural. É uma mensagem que o mundo de hoje – e em particular o espaço europeu (onde os indivíduos parecem cada vez mais avessos a assumirem as suas responsabilidades cívicas) – devia considerar atentamente.
Por um lado, a inscrição do momento actual de crise numa história maior – a americana – repleta de desafios e dificuldades. Obama mencionou as dificuldades do exército americano na luta pela independência, dos pioneiros na grande aventura da exploração do Oeste, ou dos imigrantes na sua tentativa para singrarem na América. Todavia, o Presidente não deixou de sublinhar que os Estados Unidos foram sempre capazes de enfrentar esses desafios, demonstrando uma notável capacidade de superação. Há muita gente que ainda não percebeu o que quer dizer Obama com “esperança”. Não se trata de aguardar por soluções messiânicas, mas sim de apelar ao engenho e ao espírito de luta americanos – que nos momentos mais difíceis ergueram uma e outra vez os Estados Unidos.
Em segundo lugar, é notável a forma como Obama, partindo dessa referência a uma narrativa comum, apela ao esforço pessoal de cada indivíduo e à sua intervenção cívica – percebendo que o verdadeiro progresso de uma sociedade depende afinal do contributo de cada um dos seus membros. Estamos, pois, perante um verdadeiro elogio da cidadania – próprio aliás da tradição política americana – que destaca a singularidade de cada indivíduo, destacando simultaneamente o seu papel determinante num tecido social plural. É uma mensagem que o mundo de hoje – e em particular o espaço europeu (onde os indivíduos parecem cada vez mais avessos a assumirem as suas responsabilidades cívicas) – devia considerar atentamente.
sexta-feira, 16 de janeiro de 2009
Oito anos de Bush: um balanço
Costuma dizer-se que só a história julgará devidamente os feitos de uma Presidência. Mas neste caso é fácil anteciparmo-nos, pois a Administração Bush foi uma das mais incompetentes das últimas décadas. Concedo que houve alguns aspectos positivos: o sucesso na segurança interna pós-11 de Setembro; o reforço das trocas comerciais e das relações políticas com o Sudeste Asiático e diversos países africanos; a relativa estabilização do Iraque nos últimos meses.
É muito pouco quando comparado com os disparates acumulados em oito anos. Uma invasão despropositada de um país soberano, alicerçada num absurdo e perigosíssimo conceito estratégico (“a guerra preventiva”). Como se isto não bastasse, a Administração foi incapaz de traçar um plano pós-intervenção militar, o que provocou um caos político e social que só agora começa a normalizar. Uma intervenção falhada no Afeganistão, país entregue a traficantes de drogas, “senhores da guerra” e minada de focos de instabilidade permanente. Inabilidade para criar laços de cooperação com a esmagadora maioria dos países europeus, para já não falar da América Latina. Erros sistemáticos relativamente ao Irão (que está à beira de se tornar uma potência nuclear, enquanto os EUA assobiam para o lado). E já nem vou falar do conflito israelo-árabe.
Na política interna o quadro não é melhor. A Administração Bush foi incapaz de propor uma revisão credível do sistema de saúde ou da segurança social, tendo em relação a esta última avançado com uma proposta de lei tão absurda que o Congresso a chumbou por larga maioria. Pouco ou nada se fez em relação à independência energética, com a Administração indiferente às energias renováveis. A política ambiental foi catastrófica, envolvendo chantagens a cientistas no tema do aquecimento global e uma indiferença gritante face aos evidentes desafios do nosso tempo. A gestão do "caso Katrina" foi pavorosa.
Guantánamo, os abusos em Abu Ghraib e o uso recorrente da tortura enfraqueceram os alicerces morais da América. A política fiscal esvaziou os bolsos da classe média. O endividamento externo cresceu brutalmente. As agências federais gastaram milhões de dólares em programas inúteis, alargando o peso do Estado sem repercussões a nível social e económico. Embora a grave crise financeira seja fruto de causas muito diversas, a Administração Bush não fica isenta de culpas, promovendo o desregulamento dos mercados e assistindo impávida à crise do sub-prime. E é melhor nem falar do estilo – cheio de tiques autoritários – ou dos escândalos de corrupção (veja-se o “caso Abramoff”), dos reiterados abusos de poder ou dos atentados às liberdades individuais (“Patriot Act”, sistemas de vigilância que violam direitos privados, etc.).
A Esquerda europeia já odiava Bush antes mesmo de ele ter tomado posse – porque é alimentada de um modo geral por um anti-americanismo sistemático, pelo que teria em qualquer caso traçado um quadro cinzento da sua Presidência. Porém, mesmo aqueles que se situam mais à Direita no espectro político, ou que olham com reverência e entusiasmo para os Estados Unidos (e acreditem que eu sou um deles), não podem deixar de estar desiludidos com a Administração liderada por George W. Bush.
[Também publicado no Delito de Opinião].
É muito pouco quando comparado com os disparates acumulados em oito anos. Uma invasão despropositada de um país soberano, alicerçada num absurdo e perigosíssimo conceito estratégico (“a guerra preventiva”). Como se isto não bastasse, a Administração foi incapaz de traçar um plano pós-intervenção militar, o que provocou um caos político e social que só agora começa a normalizar. Uma intervenção falhada no Afeganistão, país entregue a traficantes de drogas, “senhores da guerra” e minada de focos de instabilidade permanente. Inabilidade para criar laços de cooperação com a esmagadora maioria dos países europeus, para já não falar da América Latina. Erros sistemáticos relativamente ao Irão (que está à beira de se tornar uma potência nuclear, enquanto os EUA assobiam para o lado). E já nem vou falar do conflito israelo-árabe.
Na política interna o quadro não é melhor. A Administração Bush foi incapaz de propor uma revisão credível do sistema de saúde ou da segurança social, tendo em relação a esta última avançado com uma proposta de lei tão absurda que o Congresso a chumbou por larga maioria. Pouco ou nada se fez em relação à independência energética, com a Administração indiferente às energias renováveis. A política ambiental foi catastrófica, envolvendo chantagens a cientistas no tema do aquecimento global e uma indiferença gritante face aos evidentes desafios do nosso tempo. A gestão do "caso Katrina" foi pavorosa.
Guantánamo, os abusos em Abu Ghraib e o uso recorrente da tortura enfraqueceram os alicerces morais da América. A política fiscal esvaziou os bolsos da classe média. O endividamento externo cresceu brutalmente. As agências federais gastaram milhões de dólares em programas inúteis, alargando o peso do Estado sem repercussões a nível social e económico. Embora a grave crise financeira seja fruto de causas muito diversas, a Administração Bush não fica isenta de culpas, promovendo o desregulamento dos mercados e assistindo impávida à crise do sub-prime. E é melhor nem falar do estilo – cheio de tiques autoritários – ou dos escândalos de corrupção (veja-se o “caso Abramoff”), dos reiterados abusos de poder ou dos atentados às liberdades individuais (“Patriot Act”, sistemas de vigilância que violam direitos privados, etc.).
A Esquerda europeia já odiava Bush antes mesmo de ele ter tomado posse – porque é alimentada de um modo geral por um anti-americanismo sistemático, pelo que teria em qualquer caso traçado um quadro cinzento da sua Presidência. Porém, mesmo aqueles que se situam mais à Direita no espectro político, ou que olham com reverência e entusiasmo para os Estados Unidos (e acreditem que eu sou um deles), não podem deixar de estar desiludidos com a Administração liderada por George W. Bush.
[Também publicado no Delito de Opinião].
terça-feira, 6 de janeiro de 2009
Novidades do Minesotta
Depois de um extenuante processo de recontagem de votos, o Democrata Al Franken foi declarado vencedor da eleição para o Senado, derrotando o Republicano Norm Coleman por apenas 225 votos (num universo total de 2,9 milhões). Coleman liderava a corrida na primeira contagem oficial, mas a detecção de uma série de erros e a validação pelo tribunal de diversos votos condicionados (na maioria favoráveis a Franken) inverteu o cenário inicial.
Contudo, o resultado é oficial, mas não definitivo. Isto porque Coleman vai interpor uma acção no tribunal estadual, alegando que 600 votos condicionados ("absentee ballots") ficaram por contar, e que vários boletins de voto foram atribuídos por duas vezes a Franken. Se estes lapsos se confirmarem, é possível que tenhamos em breve uma nova recontagem geral - num dos processos eleitorais mais bizarros e ao mesmo tempo fascinantes dos últimos tempos.
segunda-feira, 5 de janeiro de 2009
E porque quem corre por gosto não cansa...
... agora escrevo também no "Delito de Opinião", na companhia de nove magníficos escribas. Prometemos falar um pouco de tudo, desde política (portuguesa e internacional) a literatura, cinema, música e cenas do nosso quotidiano lusitano. Espero que gostem!
Richardson out
Numa surpreendente decisão, Bill Richardson renunciou à nomeação para o cargo de Secretário do Comércio. Como escrevemos anteriormente, Richardson é um nome consagrado nos EUA, pelo seu trabalho como Secretário da Energia na Administração Clinton e como Embaixador na ONU. Tudo indicava que seria um dos nomes fortes na futura Administração Obama, mas a existência de uma investigação criminal sobre negócios financeiros e comerciais no Novo México (Estado do qual é Governador) levantou suspeitas sobre Richardson e este entendeu retirar o seu nome da equação..
Richardson declara-se inocente, alegando que a sua decisão visa somente facilitar a formação rápida de uma Administração, o que estaria em causa com as previsíveis objecções suscitadas nas audiências de confirmação no Senado, provocadas pela referida investigação criminal. Num momento algo delicado para o país e para o Partido Democrata (veja-se o "caso Blagojevich"), julgo que Richardson procurou sobretudo livrar Obama de novos problemas...
Caos no Illinois
Definitivamente a confusão reina no Estado de Al Capone, com o Governador Blagojevich a desafiar todas as regras da lógica e bom senso, nomeando Roland Burris para o Senado (como substituto de Obama). Não que Burris não tenha um excelente currículo público (foi procurador-geral do Illinois e servira anteriormente na administração fiscal do Estado), mas era francamente desaconselhável a Blagojevich avançar com um nome concreto quando pendem sobre si acusações da maior gravidade (em particular a de que fez depender a sua escolha do pagamento de avultadas quantias).
O líder da maioria Democrata no Senado, Harry Reid, já veio afirmar que o Senado não vai aceitar aquela nomeação, utilizando os dispositivos legais existentes (normas processuais sobre a admissão de senadores nomeados, precedentes legais e constitucionais, etc.). Resta saber quem vai ganhar esta verdadeira batalha político-judicial. Para já, as opiniões dividem-se: constitucionalistas como Akhil Amar e Josh Chafetz defendem os poderes de bloqueio do Senado, mas Brian Kalt apresenta um excelente contra-argumento aqui. E ainda a procissão vai no adro...
O líder da maioria Democrata no Senado, Harry Reid, já veio afirmar que o Senado não vai aceitar aquela nomeação, utilizando os dispositivos legais existentes (normas processuais sobre a admissão de senadores nomeados, precedentes legais e constitucionais, etc.). Resta saber quem vai ganhar esta verdadeira batalha político-judicial. Para já, as opiniões dividem-se: constitucionalistas como Akhil Amar e Josh Chafetz defendem os poderes de bloqueio do Senado, mas Brian Kalt apresenta um excelente contra-argumento aqui. E ainda a procissão vai no adro...
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