quarta-feira, 24 de dezembro de 2008

Em banho-maria

O blogue entra numa pequena pausa por ocasião das festividades da ordem. Feliz Natal e um excelente Ano Novo a todos os leitores. Até breve!

Citação do dia

"Two months after Barack Obama's election, Republicans are struggling to figure out how — or even whether — to challenge or criticize him as he prepares to assume the presidency.
The president-elect is proving to be an elusive and frustrating target. He has defied attempts to be framed ideologically [...] [and] his cabinet picks have won wide praise."
, Adam Nagourney, New York Times.

segunda-feira, 22 de dezembro de 2008

Resultados eleitorais: actualização

Já existem dados finais para a Câmara dos Representantes. Em três desfechos sujeitos a recontagem, os Democratas venceram dois lugares (5º Distrito da Virgínia e 15º do Ohio) e os Republicanos um (McClintock triunfou no 4º Distrito da Califórnia). Duas eleições especiais que decorreram na Louisiana (adiadas devido ao furacão Gustav) foram ganhas pelos candidatos Republicanos. Uma delas permitiu a Joseph Cao tornar-se o primeiro americano de ascendência vietnamita a ser eleito para o Congresso. A contabilidade final mostra que os Democratas obtiveram 257 lugares, contra 178 dos Republicanos - um ganho de 21 deputados para os Democratas em relação a 2006.

A situação do Senado permanece mais confusa. Por um lado, continua a decorrer a recontagem no Minnesota, com um comité independente a analisar uma série de boletins de voto "contestados" pelas duas candidaturas principais. As últimas notícias indicam que o Democrata Al Franken beneficia de uma ligeira vantagem (cerca de 250 votos em 2,9 milhões), mas ainda não há quaisquer certezas nesta batalha eleitoral épica.

Por outro lado, existe uma série de vagas para preencher através de nomeação directa. Referimo-nos aos lugares de Obama (Illinois), Joe Biden (Delaware), Hillary Clinton (Nova Iorque) e Ken Salazar (Colorado), uma vez que estas quatro personalidades irão ocupar cargos na Administração federal. Têm sido avançados vários nomes (com destaque para o de Caroline Kennedy representando potencialmente Nova Iorque), mas também aqui não há ainda confirmações oficiais.

sexta-feira, 19 de dezembro de 2008

Adeus Guatanamo? (2)

Como tínhamos referido antes, a Administração Obama parece firmemente empenhada em encerrar a célebre prisão cubana, tendo o porta-voz do Secretário da Defesa, Robert Gates, anunciado ontem que decorrem já preparativos oficiais nesse sentido.

A concretizar-se esta ideia, Obama enviaria um importante sinal para a opinião pública e para a comunidade internacional, rompendo claramente com as práticas da Administração Bush no domínio dos direitos humanos e das liberdades constitucionais, marcadas por abusos e violações sistemáticas.

quarta-feira, 17 de dezembro de 2008

Deus e a América

Trata-se de um tema muitíssimo estudado, sobre o qual existem milhares de livros e artigos, com análises sobre o peso social, político e cultural que a religião desempenha nos EUA, e comentários acerca da natureza religiosa ou irreligiosa da Constituição americana.

Neste complexo aglomerado, sobressai contudo um pequeno episódio, que dá conta como poucos do que realmente esteve em causa quando os Pais Fundadores criaram a República americana: a ideia que a ordem constitucional deve remeter-se ao silêncio no domínio da religião, a qual cabe apenas à consciência dos indivíduos.

Conta a lenda que, pouco depois de deixar a Convenção de Filadélfia, Alexander Hamilton (participante na elaboração da Constituição) foi abordado por um pastor protestante em Nova Iorque, que lhe perguntou por que motivo a Constituição não aludia à existência de Deus. A resposta de Hamilton vale por todos os tratados deste mundo: “Indeed, sir, we forgot it”.

segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

Bush (quase) agredido

Na última viagem como Presidente ao Iraque, George W. Bush foi presenteado com um interessante par de sapatos, lançado por um jornalista iraquiano. Bush conseguiu desviar-se da ameaça, num belo golpe de rins, mas dificilmente poderá escapar às críticas pelos gravíssimos erros cometidos em território iraquiano desde 2003.

Citação do dia

"[...] Dewey understood that progress demands that the boat be rocked. And his contemporary Franklin Delano Roosevelt understood it as well. «The country needs, and, unless I mistake its temper, the country demands, bold, persistent experimentation. It is common sense to take a method and try it: if it fails, admit it frankly and try another. But above all, try something. The millions who are in want will not stand by silently forever while the things to satisfy their needs are within easy reach.» That is pragmatism we can believe in. Our times demand no less.", Christopher Hayes, The Nation.

sexta-feira, 12 de dezembro de 2008

Sobre os deputados faltosos

Nesta polémica nacional, mais importante do que saber quem são esses deputados era discutir por que é que faltaram. As respostas são complexas mas desembocam na mesma ideia: no regime parlamentar português os deputados são joguetes dos partidos. Impedidos de governar (se na minoria), pressionados para não discordar (se na maioria) e a braços com imposições de voto da sua bancada (mesmo que contra a sua consciência), os deputados poucas hipóteses têm de se preocupar com o interesse público, sendo por isso quase inútil a sua presença na Assembleia.

Num sistema onde vinga a disciplina partidária – esse mecanismo absurdo que nega toda a lógica política e ética – os deputados são meros figurantes, a quem se pede sobretudo obediência, e não exactamente um juízo próprio. Neste aspecto muito podíamos aprender com os Estados Unidos, onde existem naturalmente dinâmicas partidárias, mas onde a ponderação e a opinião individual de um deputado são tidos como valores intocáveis.

Por outro lado, enquanto os modelos eleitorais portugueses insistirem na votação “por listas”, nunca o povo poderá directamente punir os deputados incapazes (faltosos ou presentes), que apenas se devem preocupar em agradar às cúpulas partidárias – e assim garantir uma presença na “lista”, se possível em “lugar elegível”. Para quando círculos uninominais, criando uma verdadeira proximidade entre representantes e representados?

E já agora (chamem-me utópico), por que não reproduzir um dos elementos mais notáveis do sistema político norte-americano – a existência de eleições primárias? Desse modo retirar-se-ia aos partidos o controlo absoluto sobre as nomeações políticas para cargos ao serviço do povo, obrigando os candidatos a dirigirem-se, não já às “famigeradas sedes partidárias”, mas directamente aos eleitores. Sobre este tema, afirmava em 1912 um dos grandes progressistas da história americana, Robert La Follette:

“A nomeação de candidatos para a ocupação de cargos públicos é o fundamento do governo representativo. Se homens mal-intencionados controlarem as nomeações não é possível obtermos um bom governo. [...] Temos de [...] submeter todas as nomeações ao voto directo em eleições primárias. Estando as nomeações dos candidatos sob o controlo do povo [...] o titular de um cargo público não se atreverá a procurar a renomeação caso tenha [...] traído a confiança do público”.

Sim, isto foi proferido em 1912. Temos um longo caminho a percorrer? Então é melhor começarmos já a tratar do assunto.

quarta-feira, 10 de dezembro de 2008

Obama e Blagojevich

Este vídeo pode ser útil para evitarmos uma leitura apressada do mais recente escândalo nos Estados Unidos, envolvendo o actual Governador do Illinois, Rod Blagojevich. Estando incumbindo de nomear um senador para ocupar a vaga deixada por Obama, Blagojevich ter-se-á envolvido em práticas gravíssimas de corrupção, oferecendo literalmente o cargo a quem lhe pagasse mais dinheiro.

Como se não bastasse este desplante - e mesmo sabendo que estava já a ser investigado por abuso de poder - Blagojevich terá exigido altas remunerações para a sua esposa, financiamento e apoios variados para a sua carreira política, entre outras benesses, ameaçando os "candidatos" que caso ninguém lhe pagasse o que pretendia, nomear-se-ia a si próprio.

Esta situação bizarra (reveladora de uma idiotice difícil de qualificar) foi aproveitada pelos sectores políticos mais à Direita para atacarem Barack Obama, referindo a sua relação com Blagojevich. Todavia, se é verdade que Obama foi conselheiro político de Blagojevich em 2002, desde então afastou-se quase completamente do actual Governador, que por sua vez lhe teceu violentas críticas públicas.

O vídeo acima sublinha justamente este dado, mostrando que este episódio não enfraquecerá Obama - bem pelo contrário, uma vez que um dos seus "adversários políticos" caiu em desgraça na opinião pública. Como refere o comentador da CNN, Obama tem mais razões para se sentir aliviado do que preocupado.

terça-feira, 9 de dezembro de 2008

Um governo à deriva

Não deixem de ler este texto de Jonathan Stein sobre o estado actual da política federal, a partir de um relatório do U.S. Government Accountability Office. Segundo Stein, a Administração Obama vai herdar uma situação governativa calamitosa. Com efeito, aquele relatório descreve um cenário de bancarrota geral, de descoordenação entre departamentos, de falta de organização governativa, de inexistência de planos de emergência na defesa, saúde ou ambiente, de desperdício de fundos e de incompetência administrativa. Para não variar, a Administração Bush fica muito mal na fotografia...

domingo, 7 de dezembro de 2008

2012

Parece longe, mas já se fazem conjecturas sobre as eleições presidenciais, em especial acerca dos potenciais candidatos Republicanos. No mercado electrónico Intrade - autêntica "bolsa de apostas" - os nomes de Mitt Romney e do Governador da Louisiana, Bobby Jindal, encabeçam a lista. Também bem colocados parecem estar Sarah Palin, Tim Pawlenty (Governador do Minnesota) e Mike Huckabee (candidato nas primárias deste ano). A Zogby, por sua vez, conduziu uma sondagem pela Internet e os resultados são interessantes, mostrando Palin no topo das preferências (24%), seguida de Romney (18), Jindal (16) e Huckabee (10).

Parece-me cedo para falar de nomes concretos, mas é possível tecer considerações sobre o perfil provável do candidato. Eu destacaria três vias, sendo que uma se tornará predominante na sequência do tipo de governação do Presidente Obama e do clima político da altura:

1) Os Republicanos viram-se para a ala mais populista e conservadora do partido, apostando na mobilização da base (um pouco como em 2000). Palin, o jovem promissor Jindal ou Huckabee seriam as hipóteses naturais.

2) A economia é o tema dominante da eleição. Os Republicanos preferem uma figura mais moderada, mas com credibilidade na área. Romney é o nome crucial. O antigo presidente da Câmara dos Representantes, Newt Gingrich, também seria um bom candidato.

3) O debate centra-se na segurança e na política externa. Obama teria falhado como "comandante-chefe" e os Republicanos apostam num discurso agressivo. Giuliani ou uma figura prestigiada do exército (o general Petraeus?) tornam-se os favoritos...

sábado, 6 de dezembro de 2008

A equipa de Obama (4)

Tal como a escolha de Hillary Clinton revelou, as recentes nomeações de Obama procuram sobretudo transmitir uma mensagem de responsabilidade e ponderação, trazendo para as chefias dos vários departamentos federais figuras públicas de renome e/ou com grande experiência nas suas áreas. Vejam-se quatro exemplos importantes:

Bill Richardson (na foto) fica com a pasta do Comércio. Antigo embaixador americano na ONU, ocupara já o cargo de Secretário da Energia na Administração Clinton. Conhece os meandros de Washington, tem experiência legislativa (Congressista durante 14 anos) e executiva (Governador do Novo México desde 2003), e serve a causa pública há 25 anos.

O general de quatro estrelas James Jones foi escolhido para Conselheiro de Segurança Nacional. Com um notável currículo militar (líder dos Fuzileiros americanos, Comandante Supremo da NATO), Jones cooperou com a Administração Bush em programas de estratégia e segurança no Médio Oriente, e é uma das vozes mais independentes e reconhecidas nesta área a nível mundial.

Robert Gates (foto) transita da anterior Administração como Secretário da Defesa, comprometendo-se a fazer a ponte entre a actual estratégia no Iraque e no Afeganistão e a nova orientação política que Obama pretende conferir a esses conflitos.
Janet Napolitano foi nomeada para a pasta da Segurança Interna. Considerada uma das Governadoras mais competentes dos EUA, Napolitano tem uma vasta experiência no campo da advocacia e é uma figura muito popular no seio do Partido Democrata, pela sua capacidade de liderança e conhecimento de vastos dossiers políticos.

quinta-feira, 4 de dezembro de 2008

O regresso dos Bush?

Ainda George não deixou Washington e já o seu irmão mais novo, Jeb, pondera mudar-se para a capital, como senador da Florida. Mel Martinez, o actual incumbente, comunicou ontem o seu desejo de abandonar o Senado em 2010, abrindo assim caminho para uma disputada sucessão. E se é garantido que os Democratas vão apostar forte no "sunshine state", não é menos verdade que os Republicanos possuem uma série de políticos de primeira linha na Florida. O actual Governador, Charlie Crist, poderá ser um candidato fortíssimo, mas de momento é Jeb Bush, que deteve o poder executivo na Florida entre 1999 e 2007, a ocupar os cabeçalhos na imprensa depois de anunciar que pondera ser candidato à mais alta câmara federal.

Citação do dia

"The most notable characteristic of the Bush administration’s science policy has been the repeated distortion and suppression of scientific evidence in order to fit ideological preferences about how the world should be, rather than how it is.", Olivia Judson, no New York Times.

quarta-feira, 3 de dezembro de 2008

Eleições na Geórgia

O Republicano Saxby Chambliss venceu a segunda volta da eleição para o Senado, derrotando claramente Jim Martin (quando escrevo, Cambliss lidera por 16%, com 96% dos votos apurados). Chambliss representará assim o Estado da Geórgia durante os próximos seis anos (segundo mandato), mercê de um triunfo aguardado, mas que poucos esperavam vir a ser tão expressivo.

Há vários motivos que o podem explicar, contudo. A máquina Republicana empenhou-se a fundo nesta disputa, depois da pesada derrota nas eleições gerais de 4 de Novembro, tendo figuras nacionais como Sarah Palin, Rudy Giuliani e o próprio John McCain feito campanha pelo senador Chambliss. Esse empenho traduziu-se numa boa mobilização do eleitorado tradicional, especialmente nas áreas rurais e nos subúrbios, onde Chambliss obteve excelentes resultados.

Os Democratas, pelo contrário, não foram capazes de reproduzir a notável mobilização do eleitorado afro-americano em 4 de Novembro, que deixou Obama apenas a 5% de McCain. Por outro lado, as condições políticas eram adversas: a Geórgia é um dos Estados mais conservadores da nação, Chambliss era um incumbente relativamente popular e Jim Martin arrancou demasiado tarde para a campanha, depois de umas primárias muito disputadas contra Vernon Jones.

Com esta vitória, os Republicanos garantiram uma minoria de bloqueio no Senado (41 lugares), independentemente de quem vencer a recontagem no Minesotta. Significa isto que poderão obstruir (filibuster) a votação de determinadas propostas prolongando indefinidamente o debate (os Democratas precisariam de 60 senadores para o evitarem). Este facto poderá assim exigir da Administração Obama uma grande capacidade de negociação com a bancada Republicana. Como referi antes, não é por acaso que o novo Presidente-eleito continua a dar sinais de pretender avançar com um gabinete e uma agenda política suprapartidários...

terça-feira, 2 de dezembro de 2008

Hillary Clinton, Secretária de Estado

O rumor tornou-se hoje uma notícia oficial. Trata-se evidentemente de uma escolha difícil de avaliar, pela persona política singular que é Hillary Clinton e pelo que tal decisão nos diz acerca de uma futura Administração Obama. Eu avançaria com três notas:

1. Do ponto de vista da política objectiva é uma escolha excelente. Hillary tem um bom conhecimento de política externa; desempenhou durante vários anos (como Primeira-Dama) um papel importante na diplomacia americana, ainda que de forma "simbólica"; é conhecida pela maioria dos líderes internacionais, que a identificam com um período da história americana em que a palavra multilateralismo ainda queria dizer alguma coisa; e parece-me uma negociadora muito razoável.

2. Tomando-o como estratégia política é igualmente acertado. Obama parece ter-se inspirando no ideal "equipa de rivais", integrando uma potencial adversária na sua Administração e comprometendo-a por isso às suas próprias decisões. Com Hillary na Secretaria de Estado Obama silencia uma voz dissonante no Senado que poderia ser ensurdecedora por volta de 2012. De certo modo, esta jogada reproduz inteligentes manobras do passado, quando Abraham Lincoln juntou no seu próprio gabinete antigos inimigos políticos, ou quando Kennedy convidou o seu maior adversário na Convenção Democrata, o senador Lyndon Johnson, para fazer parte do "ticket presidencial" de 1960.

3. Por fim, a escolha de Hillary Clinton envia um importante e tranquilizador sinal político à opinião pública. Com efeito, Obama foi anteriormente atacado por ser demasiado liberal e estar dependente dos sectores mais à esquerda do Partido Democrata. A escolha de uma senadora moderada e experiente, ligada a uma das Administrações mais centristas dos últimos tempos, mostra que Obama pretende seguir uma agenda própria, que provavelmente reconciliará decisões estratégicas conservadoras com uma política socialmente progressista.

É certo que Obama pode ser acusado de estar a trair a mensagem de mudança que caracterizou a sua campanha, mas talvez mais importante que isso é difundir a ideia de que a Administração Obama se guiará por princípios moderados, racionais e ponderados, rompendo com um irresponsável passado recente.